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PREFEITURA MUNICIPAL DE CAMPINAS
Secretaria Municipal de Justiça
Procuradoria-Geral do Município de Campinas
Coordenadoria de Estudos Jurídicos e Biblioteca

Este texto não substitui o publicado no Diário Oficial do Município - DOM.

PORTARIA Nº 06 DE 19 DE NOVEMBRO DE 2004

(Publicação DOM de 20/11/2004 p.10)

Implanta o Protocolo Paidéia para Redução de Danos no Uso de Silicone Industrial e Hormonioterapia na População de Travestis e Transexuais no Município de Campinas

CONSIDERANDO que a redução de danos é uma estratégia de saúde pública que orienta a execução de ações de prevenção das consequências danosas à saúde que decorrem do uso de drogas, sem interferir na oferta ou no consumo, tendo como princípio fundamental á liberdade de escolha.
CONSIDERANDO que as ações de redução de danos devem ter como diretriz a assistência humanitária no sentido de reduzir, controlar e evitar prejuízos a saúde dos indivíduos e da coletividade.
CONSIDERANDO a necessidade de se garantir uma política de saúde não discriminatória, respeitando as diversas possibilidades de orientação afetivo-sexual dos indivíduos.
A Secretária Municipal de Saúde, no uso de suas atribuições

RESOLVE

Art. 1º  Implantar o Protocolo Paidéia para Redução de Danos no Uso de Silicone Industrial e Hormonioterapia na População de Travestis e Transexuais na Secretaria Municipal de Saúde de Campinas, conforme ANEXO I.

Art. 2º  Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.

Campinas, de novembro de 2004

MARIA DO CARMO CABRAL CARPINTÉRO
Secretária Municipal de Saúde

ANEXO I

PROTOCOLO PAIDÉIA PARA REDUÇÃO DE DANOS NO USO DE SILICONE INDUSTRIAL E HORMONIOTERAPIA NA POPULAÇÃO DE TRAVESTIS E TRANSEXUAIS DO MUNICÍPIO DE CAMPINAS

Prefeitura Municipal de Campinas
IZALENE TIENE

Secretaria Municipal de Saúde
MARIA DO CARMO CABRAL CARPINTÉRO

Departamento de Saúde
ROBERTO MARDEM SOARES FARIAS

Secretaria Municipal de Assuntos Jurídicos e da Cidadania
MARILIA CRISTINA BORGES

Centro de Referência GLTTB
PAULO REIS DOS SANTOS

Coordenação Projeto
PAULO REIS DOS SANTOS
MARIA AUXILIADORA ZANIN

GRUPO DE TRABALHO

Adriane Pianowsk Enfermeira Sanitarista Apoiadora do Distrito Norte
Adriano Morad Blay Médico Endocrinologista Policlínica II
Alan Carneiro Conselheiro do Orçamento Participativo
Bárbara D. Meneses Psicóloga do Centro de Referência GLTTB
Cristina Dumont - Travesti
Cristiane Simões Assitente Jurídica do Centro de Referência GLTTB
Elisabete Gonçalves Zuza Coordenadora do Núcleo de Prevenção às DST/AIDS do Programa Municipal de DST/AIDS
Fernanda A. Sanna Assessora da Secretaria Municipal de Assuntos Jurídicos e da Cidadania
Ingrid - Travesti
Janaína Lima Coordenadora de Travestis do IDENTIDADE Grupo de Ação pela Cidadania Homossexual
José Ronaldo C. Boston - Cirurgião Plástico
Josiane Rodrigues - Travesti
Kathleen Tereza da Cruz Médica Generalista
Ligia S. N. Almeida Policlínica II
Marcelo de Oliveira Movimento GLTTB
Maria Alice Satto Enfermeira
Maria Auxiliadora Zanin Médica Sanitarista
Mariana Morishita Coordenadoria da Mulher
Mary Fujimori Conselheira Suplente do Orçamento Participativo
Morgana Travesti
Nilva Ferreira Pereira Médica Ginecologista e Sexóloga Centro de Saúde Centro
Paulo Reis dos Santos Coordenador do Centro de Referência GLTTB
Rodrigo Braga do Couto Rosa Movimento GLTTB
Valdete Alves de Queiroz Enfermeira Coordenadora do Programa de Redução de Danos do Centro de Referência em DST/AIDS.
Valdirene dos Santos Assistente Social do Centro de Referência GLTTB
Valéria C. J. Figueiredo Coordenadora do Ambulatório do Hospital Municipal Dr. Mário Gatti
Vanila Macedo - Travesti
Verônica Castro Travesti
William Siqueira Peres Médico Psiquiatra Professor Assitente do Depto. de Psicologia da FCL/UNESP Assis/SP.

INTRODUÇÃO

Este protocolo Paidéia está inserido em uma proposta mais ampla de políticas públicas, voltadas para a população GLTTB (Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais) de Campinas, elaborada em suas linhas gerais pelo Movimento Homossexual da cidade, aprovado no Orçamento Participativo (OP) na temática da Cidadania, no ano de 2002 a ser desenvolvido em parceria com a Secretaria Municipal de Saúde.

OBJETIVOS GERAIS:

1- Reduzir os danos à saúde pelo uso indiscriminado de silicone industrial e hormonioterapia e;
2- Estimular a reflexão dos indivíduos que pretendem alterar suas formas corporais (feminilização do corpo masculino) através da aplicação do silicone industrial e da hormonioterapia, antes da tomada de decisão para iniciar o uso, através do conhecimento das possíveis sequelas.
3- Oferecer atenção integral a saúde das travestis e transexuais.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS:

1- Ofertar informações para os homossexuais e transgêneros sobre as várias técnicas de modificação do corpo e seus riscos físicos e psíquicos1;
2- Ofertar apoio psicossocial para a tomada de decisão em relação à mudança do corpo, abordando tanto a transformação física quanto a mudança da imagem corporal e da identidade social;
3- Sistematizar e divulgar as informações sobre o uso e riscos do silicone industrial e da hormonioterapia;
4- Produzir material informativo para os usuários efetivos e usuários em potencial;
5- Capacitar os profissionais para o acolhimento dos usuários de silicone industrial nos serviços públicos de saúde e desenvolver protocolos de acompanhamento clínico e
6- Facilitar o acesso dos usuários de silicone industrial e hormonioterapia à todos os recursos necessários para o reparo dos danos causados à saúde.
Este projeto tem como população alvo os Indivíduos que desejam alterar suas formas corporais e/ ou Travestis e Transexuais que já utilizaram o silicone industrial e hormonioterapia.

PROPOSTAS DO OP PARA AÇÃO:

1- Apoio psicológico para os usuários do SUS que apresentem conflitos referentes ao seu corpo e com desejo de transformá-lo; e para os que já utilizaram silicone industrial e hormonioterapia;
2- Assistência clinica aos usuários de silicone industrial e hormonioterapia e
3- Divulgar informações quanto aos riscos do uso do silicone industrial e hormonioterapia.

CONSIDERAÇÕES INICIAIS

As ações de redução de danos constituem um conjunto de medidas de saúde pública voltadas a minimizar as consequências adversas do uso de substâncias ilícitas (drogas, silicone industrial) e uso indevido de substâncias não ilícitas (hormônios e remédios), sendo que o princípio fundamental que as orienta é o respeito à liberdade de escolha.
A filosofia da redução de danos deve ser humanitária, pragmática e desprovida de críticas ao indivíduo que opta pela saúde e responsabilidade pessoal ao invés do modelo tradicional e punitivo Entende-se como redução de danos para o uso de silicone liquido industrial e hormonioterapia, qualquer passo no sentido de provocar menor risco à saúde, através da execução de ações para REDUZIR, CONTROLAR E EVITAR prejuízos aos indivíduos/comunidade.
A Redução de Danos pode ocorrer em todos os níveis de atenção à saúde: educação, prevenção, tratamento e reabilitação.

PROPOSTA DE SEGUIMENTO CLÍNICO AO USUÁRIO DE SILICONE INDUSTRIAL E/OU HORMONIOTERAPIA

AVALIAÇÃO CLÍNICA INICIAL:

Anamnese - além dos dados gerais, incluir:
Sexo biológico ............... (.....) masculino
........................................(.....) feminino
Identidade de gênero ..... (.....) travestis
........................................(.....) transexual

Histórico de uso de silicone industrial:
Há quanto tempo aplicou?
Em que parte do corpo aplicou?
Em que circunstâncias (foi obrigada a aplicar, ou fez espontaneamente)?
Com quem fez aplicação?
Quantidade injetada?
Tipo de agulha?
Condições de higiene do equipamento utilizado?
Condições de higiene do local onde foi realizado o procedimento?
Houve complicações?
Quais?

Histórico de uso de hormonioterapia:
Que tipo de hormônio utiliza/utilizou?
Qual a dose utilizada ?
Qual o tempo de utilização?
Qual a forma utilizada (injetável, oral ou transdérmico)?
Efeitos esperados em relação ao hormônio utilizado e efeitos obtidos:

Atividade e função sexual:
Pratica sexo oral?
Pratica sexo anal?
Quais outras práticas sexuais?
Como é o desejo sexual?
Tem ereção?
Tem ejaculação?

Sintomas atuais:
Dispnéia ............................... (.....) sim ..... (.....) não
Oligúria ................................. (.....) sim ..... (.....) não
Dores articulares ................... (.....) sim ..... (.....) não
Febre ................................... (......) sim ..... (.....) não

Episódios de sangramento anormal:
Gengivorragia ................... (.....) sim ..... (.....) não
Epistaxe .......................... (.....) sim ..... (.....) não
Petéquias ........................ (.....) sim ..... (.....) não
Hematomas espontâneos .. (.....) sim ..... (.....) não
Dor à evacuação ............... (.....) sim ..... (.....) não
Tenesmo .......................... (.....) sim ..... (.....) não
Sangramento .................... (.....) sim ..... (.....) não

Dificuldade à micção e outros sinais de comprometimento renal:
Complicações agudas : Caracteriza urgência médica o quadro de doença febril aguda que se inicia mais ou menos 24hs após a aplicação do silicone industrial, com febre alta (39 º C), dor torácica e dispnéia, que evolui rapidamente, mais ou menos três dias, para insuficiência respiratória aguda.
Complicações crônicas : Aparecem geralmente entre 6 a 13 meses após a aplicação do silicone industrial. Pesquisar quadros reumatológicos/colagenoses.
Atentar para auto-medicação : corticoterapia/ AINH/ Antibioticoterapia

EXAME FÍSICO GERAL

Peso:
Altura:
Temperatura:
Pressão arterial:
Facies - edema de origem renal
Pele e Anexos:
Icterícia
Cianose
Sinais inflamatórios:
Calor
Rubor
Edema local
Nódulos migratórios
Sinais de distúrbios da coagulação:
Spiders vasculares
Petéquias
Hematomas
Presença de tatuagens ou maquiagem definitiva
Coleções líquidas
Pilificação - extensão de feminização

EXAME FÍSICO ESPECIAL

Palpação de gânglios - adenomegalia satélite
Inspeção e palpação de mamas
Áreas de retração
Simetria
Áreas fibróticas
Nódulos
Descarga papilar
Palpação de abdomen à procura de visceromegalias
Ausculta cardíaca
Ausculta pulmonar atenta (pelo risco de migração de silicone via vascular para os pulmões-embolia)
Inspeção e palpação de órgãos genitais
Pênis
Tamanho
Forma
Testículos e bolsa escrotal
Tamanho
Consistência
Massas palpáveis
Dor à palpação (atentar para possibilidade de migração do silicone para área genital)
Toque retal - Avaliação da próstata

EXAMES COMPLEMENTARES

Exames obrigatórios a serem solicitados na unidade básica:
- Glicemia jejum
- Hemograma Completo/VHS / Coagulograma
- Uréia/Creatinina
- Sódio/ Potássio
- AST/ALT/gama GT/fosfatase alcalina
- BT e frações
- Perfil lipídico
- Urina I
- Rx de tórax
Exames solicitados pela especialidade ou pelo clínico, se necessário:
- Clearance creatinina/Proteinúria 24hs
- FAN e auto-anticorpos
-Estradiol/ Testosterona livre/ Testosterona total/ Prolactina/ LH/ FSH
- Sorologias para hepatites, DST/HIV
- LDH
Outros de acordo com história e exame físico:
- Ultrassom de partes moles
- Mamas
- Abdome total
- Pélvico.

SEGUIMENTO/FLUXO

Após consulta clínica inicial, o paciente voltará com os exames para ser encaminhado para a especialidade (endocrinologia- Poli II).
Após a avaliação da especialidade, o paciente voltará ao Centro de Saúde, com a contra-referência para acompanhamento de rotina e proposta de terapêutica singular.
O Centro de Saúde orientará a manutenção de vínculo contínuo com o Centro de Referencia GLTTB, que conta com psicólogo, assessoria jurídica, assistência social e orientações gerais.

PROPOSTA DE PESQUISA

Tendo em vista o pouco acúmulo, tanto nacional como internacional sobre este tema, e
CONSIDERANDO a magnitude em potencial deste problema de saúde pública e a gravidade dos efeitos do uso de silicone líquido e hormonioterapia, sugere-se a proposição de um estudo clínico , com acompanhamento prospectivo dos indivíduos que forem acompanhados pelos serviços do SUS de Campinas.

Obs: Fluxograma = Ver DOM de 20/11/2004:10